terça-feira, 29 de outubro de 2013

SOU NUDISTA, ALGUM PROBLEMA?



Como é de conhecimento de muitos, o Nudismo nasceu na Alemanha por volta do ano de 1900, o professor alemão Adolf Koch inicia seus alunos nos desportos ao ar livre, bom isso não é segredo para ninguém, é história documentada.

Algumas federações até preservam em seus nomes a palavra “nudismo”, entre elas podemos citar ANF Australian Nudist Federation, NZNF New Zeland Nudist Federation, e até um dos maiores acervos da preservação da memória do movimento está localizada na Flórida, Estados Unidos chama-se American Nudist Research Library.

Tenho em minhas mãos livros de diversos autores entre eles cito: “Nudismo Y Naturismo” de Fernando Cabal, edição espanhola; Storia Del Nudismo de Jean Pascal Marcacci, edição italiana e outros. Nenhum deles faz menção depreciativa com relação à palavra “Nudismo”. Interessante que no país dos índios é que “toda nudez será castigada”!

Qualquer coisa que se relacione com a nudez humana a sociedade tenta criar um estigma, seja por humilhação, condenação ou culpa, não importa o nome que se dê à nudez, ela é sempre vista com olhar crítico por uma sociedade que tem medo da liberdade. Associar o nome Nudismo como se fosse algo irresponsável, inconseqüente, sem fundamentos que impliquem bem-estar psíquico, corporal e ambiental é, no mínimo, por falta de conhecimento das suas origens.

Nudismo é a consciência da própria nudez, os índios não praticavam o Nudismo, a nudez deles já era natural, não precisavam desse artifício para entrar na natureza e conversar com as árvores.

Na carta escrita em 1855 pelo chefe Seattle menciona: “Somos parte da terra e ela é parte de nós. As flores perfumosas são nossas irmãs; os gamos, os cavalos, a majestosa águia, todos são nossos irmãos. Os picos rochosos, a fragrância dos bosques, a energia vital do pônei e o homem, tudo pertence a uma só família.” Definitivamente não precisava de artifícios para entender a unicidade da vida e da interdependência de todos que por aqui habitam.

A nudez pode favorecer reflexões sobre o corpo no universo, pensar de uma forma profunda e positiva sobre si mesmo sem necessitar de títulos. São as minhas ações e atitudes que poderão me definir, e mesmo assim imprimir uma definição equivocada por causa da amplitude da nossa natureza.

Freud disse que todo homem nasce neurótico. Isto é uma meia verdade, o homem na verdade nasce em uma humanidade neurótica. O homem nasce natural, real, normal, mas no momento em que o recém-nascido se volta parte da sociedade, a neurose começa a funcionar. A neurose básica é que ele sente e pensa e se identifica com a parte que pensa, e sentir é mais real que pensar, sentir é mais natural que pensar. Nascemos com o coração que sente, mas o pensamento foi cultivado; é dado pela sociedade.

Minha nudez não faz parte do pensar, nem quero saber o que pensam a meu respeito, só quero sentir o ar, o sol, a água e a terra. Os conceitos são puramente mentais, vou dispensá-los. Sim, sou nudista, algum problema?

Evandro Telles
29/10/13



segunda-feira, 28 de outubro de 2013

VIVISSECÇÃO: CIÊNCIA OU BARBÁRIE

VIVISSECÇÃO: CIÊNCIA OU BARBÁRIE
Experimentos realizados em animais vivos transformam laboratórios em câmaras de torturas. Tudo em nome da Ciência.
A palavra complicada que usamos no título deste artigo justifica uma explicação inicial. Em sentido restrito, vivissecção é a prática (cuja origem é atribuída ao médico romano de origem grega Cláudio Galeno, no século I DC) de se dissecar animais vivos para estudar sua anatomia e fisiologia. Em sentido amplo, o termo define todos os experimentos realizados em animais vivos.
Tanto em um caso quanto no outro, porém, os resultados são sempre os  mesmos: dor e sofrimento.  É isso o que acontece nas câmaras de torturas -  eufemisticamente chamadas de laboratórios - de universidades públicas e privadas, indústrias (sobretudo de produtos farmacêuticos e cosméticos) e institutos de pesquisa.
Nelas, animais vivos - mamíferos, em especial - são submetidos a um rol extenso de experiências, cujo espaço restrito deste artigo não nos permite detalhar. Citemos algumas: a amputação de membros sadios para a implantação de próteses produzidas com novos materiais supostamente úteis aos seres humanos, a injeção de substâncias tóxicas no corpo ou a aplicação de produtos químicos na pele para a verificação dos seus efeitos e, ainda, a fixação de instrumentos em órgãos internos (como o crânio) para o monitoramento das suas atividades diante de choques elétricos ou de novas drogas.
Tudo em nome da Ciência - e, de forma velada, do dinheiro. Porque, não se iluda, este é o pano de fundo do debate. Ainda que fosse justificável a necessidade de se torturar e mutilar animais em nome da Ciência, o que é discutível, não o é fazê-lo em nome do dinheiro. Por isso, a vivissecção é, sem dúvida, a maior das questões da Bioética.
Não por acaso. Não há estatísticas oficiais sobre o número de animais mortos neste gênero de barbárie moderna, mas os PhDs alemães Milly Schar-Manzoli e Max Heller, no livro Holocausto, estimam que a máquina de dinheiro que move esta fábrica de horrores chega a consumir  extraordinários quatrocentos milhões de animais em todo o mundo, anualmente.
Não se diga, seguindo a cartilha maquiavélica, que os fins justificam os meios. No livro Alternativas ao uso de animais vivos na Educação, o biólogo paulista Sérgio Greif relaciona uma longa lista de alternativas eficazes à vivissecção, que esvaziam os discursos de que este tipo de prática é necessária: modelos e simuladores mecânicos ou de computador, realidade virtual, acompanhamento clínico em pacientes reais, auto-experimentação não-invasiva, estudo anatômico de animais mortos por causas naturais, além dos filmes e vídeos interativos. 
Apoiadas por cientistas, pesquisadores, políticos e até executivos de grandes empresas privadas, instituições sérias como a InterNiche (International Networtk of Individuals and Campaigns for a Humane Education) e a British Union for the Abolition of Vivisection (organização que existe desde o final do século 19) têm uma coleção de bem fundamentados argumentos contrários a este tipo de prática.
Provando que a preocupação com o tema não é delírio das organizações de defesa dos animais, a grande maioria das escolas de medicina dos EUA (maior berço científico do planeta) não usa animais. Entre elas, as consagradíssimas Harvard Medical School e Columbia University College of Physicians and Surgeons. Baseiam-se, entre outras coisas, em estudos que comprovam que 51,5% das drogas lançadas entre 1976 e 1985 ofereciam riscos aos seres humanos não previstos nos testes.
Já em Israel, a El Al (principal linha aérea do País) se recusa a transportar primatas para serem usados em experiências. Lá, a vivissecção é proibida em todas as instituições federais de ensino. O argumento que utilizam para justificar esta atitude, com o qual encerro este artigo, é uma primorosa lição de humanidade. “É mais importante ensinar aos alunos israelenses a compaixão pelos animais porque este sentimento certamente criará maior compaixão por seres humanos”.
Aurélio Munhoz no Twitter: http://twitter.com/aureliomunhoz

domingo, 20 de outubro de 2013

NATURISMO NA MÍDIA



Alguns dias atrás uma amiga me disse que estava no facebook e numa conversa com outra pessoa disse que era naturista/nudista. Poucos minutos depois o seu parceiro queria que ela se mostrasse sem as roupas. Isso tem sido frequentemente observado nos sites de relacionamentos, as pessoas pensam que o naturista/nudista tem que ficar se mostrando como se estivesse numa vitrine.

Tinha me comprometido a falar sobre esse assunto no II Encontro Norte Nordeste de Naturismo, mas esqueci de fazer essa abordagem, também ninguém perguntou coisa alguma, acho que todos sabem muito sobre Naturismo/Nudismo, só eu tenho dúvidas.

Tenho dúvidas, por exemplo, dos motivos que levam naturistas aceitarem que determinados programas venha fazer matérias que não possuem competência alguma para falar sobre Naturismo. O Pânico na TV é um desses programas que coloca a mulher numa posição como se fosse um objeto descartável ou para uso. O corpo é destacado como se nada tivesse de valor, a mulher é desmoralizada, usada e no fundo do vídeo sempre um assobio “fiu fiu”. Perde a mulher, perde o Naturismo.

Algumas pessoas justificam tal permissividade em função de audiência. Visibilidade equivocada não é melhor do que a verdade que defendemos. Não precisamos de quantidade de praticantes e sim de pessoas que desejam crescer e de vivenciar um estilo de vida que prega antes de tudo o respeito por nossas diferenças. Estive em quatro programas na televisão no mês de fevereiro e todos eles só realizaram perguntas inteligentes e nenhuma gracinha.

Na véspera de realizar uma palestra para alunos da Faculdade de Psicologia, o que poderá ser dito para aqueles que assistiram uma matéria sobre Naturismo no Pânico? Que é legal, oba-oba, cervejada, tudo é festa. Entrevista mesmo não houve nenhuma, só perguntas com duplo sentido, puxando pelo lado malicioso. Bom, talvez os psicólogos poderão ajudar a resolver essa disfunção mental.

Certa vez comentei com um amigo sobre um assunto que eu iria escrever, ele me disse que se fizesse a abordagem pretendida que iria perder o conceito até então conquistado. Foi aí que me dei conta de que nunca escrevi coisa alguma para agradar ninguém, nem mesmo as mídias naturistas.

Mas tudo isso tem uma explicação que muitos ainda não conseguem entender, chamamos de “Consciência” (o amigo Augusto diz que quase sempre cito essa palavra em meus textos). Dentro dos estudos da consciência temos quatro fases de identificações: 1) Identificação com o corpo, quando as pessoas mais pensam em sexo e comida. Podemos, sem medo de errar, afirmar um percentual significativo de pessoas vive nessa identificação, em torno de 70%; 2) Identificação com a Mente, nesse grupo encontramos os filósofos, matemáticos, cientistas. Uma mente lógica, dividida, racional. Chega a ser um subproduto do primeiro item; 3) Identificação com o coração, podemos aqui elencar os poetas, músicos, mais sensível, mais amoroso e por último 4) O Transcendental,  aquele ser iluminado, todos os aspectos negativos da vida foram sucumbidos, é o próprio ser, aquele que se encontrou dentro de um contexto mais amplo.

Onde a maioria das pessoas se encontra? Está explicado o motivo de termos poucos praticantes do Naturismo, a busca dessa massa de pessoas está voltada para o corpo, no mais baixo nível da consciência. A prática do Naturismo consciente é para ultrapassar essa identificação, mas se permitirmos uma mídia cujos valores estão ainda enraizados nas aparências, em nada acrescenta ao movimento naturista, muito ao contrário, somente atesta que somos um bando de depravados.

Os naturistas não devem ser contraditórios do que realmente acreditam, a escolha do tipo de programa e do entrevistador deve ser realizada com bastante cautela, de forma tal que não coloque em dúvida o Naturismo, que não sejamos motivos de piadas e chacotas. Definitivamente, não precisamos disso.



Evandro Telles
20/10/13



sábado, 19 de outubro de 2013

O DEBATE SOBRE A MORALIDADE DA EXPERIMENTAÇÃO ANIMAL: O QUE É RELEVANTE E O QUE NÃO É


Por Luciano Carlos Cunha
A maioria das discussões em torno dos experimentos feitos com animais não humanos tem girado em torno da necessidade ou não necessidade dos mesmos. De um lado, os que usam os animais defendem ser necessário o uso em pelo menos alguns experimentos. Do outro, alguns ativistas respondem apontando os riscos de se extrapolar dados de uma espécie para outra e outros problemas técnicos com a experimentação. Eu acredito que o debate se centrar nessa questão é um resultado infeliz, pois dá a entender que ambos os lados do debate assumem a seguinte premissa: “se um determinado meio é necessário para se chegar a um determinado fim, então esse fim e esse meio estão automaticamente justificados”.
Quando percebemos esse ponto, vemos que essa premissa é altamente questionável. Vamos supor que o objetivo de pelo menos alguns experimentos seja o de curar doenças. Esse fim é justificável, até louvável. Mas, segue daí que qualquer meio para se chegar a um fim louvável é automaticamente justificado, desde que seja necessário para se chegar nesse fim? A maioria de nós, incluindo os que experimentam em animais, não concordaria com essa conclusão. Imagine que, para se curar uma determinada doença fosse necessário assassinar e torturar algumas crianças. A maioria de nós defenderia que é um erro fazer isso, e que os cientistas deveriam buscar descobrir outro meio de procurar curar a doença. Assim sendo, a discussão não deveria girar em torno da necessidade ou não da experimentação animal, já que podem existir razões que mostrem que, mesmo sendo necessária em alguns casos, ainda assim ela não se justifica (discuto melhor essas razões abaixo).
O que precisa ficar claro é que o ponto central do debate não deve ser o que está sendo até agora. A questão central é que os animais que são utilizados o são porque não pertencem à espécie humana. Quando se desfavorece alguém por não pertencer a determinada espécie, o nome disso é especismo (da mesma maneira que desfavorecer alguém que não pertence a determinada raça chama-se racismo). Então, o ponto central deveria ser perguntar por que se acredita que é correto fazer experimentos em animais não humanos (ou usar para outros fins, como comer), mas não é correto usar seres humanos. Para explorar melhor esse ponto, vou sugerir um experimento mental: suponha que ficasse provado que experimentar em humanos é tecnicamente mais eficaz e, além disso, necessário para se curar uma determinada doença. O que poderia explicar o erro de se usar humanos nesse caso e que ao mesmo tempo explique que não é um erro utilizar animais não humanos?
O que poderia justificar o especismo? Para a maioria, a diferença parece óbvia: “como alguém não poderia perceber a diferença moralmente relevante entre humanos e animais de outras espécies?”. Mas, e que diferença seria essa? Não pode ser o mero fato de uns serem humanos e outros não, porque isso não explica nada. Não pode ser o fato de humanos serem mais racionais do que outros animais, porque nem todos os humanos são racionais (recém nascidos, crianças muito pequenas, idosos senis, portadores de determinadas doenças mentais, comatosos: existem animais não humanos muito mais racionais do que estes humanos). Aliás, em se tratando de humanos não racionais, ao invés de os utilizarmos como comida ou modelo de testes damos atenção primordial aos seus cuidados, já que são mais vulneráveis e mais dependentes de nós. Então, apontar que os não humanos são menos racionais só mostraria que os cuidados sobre eles deveriam ser muito maiores; tão grandes quanto aquele que geralmente temos para com um bebê.
E quanto a apontar que na natureza o mais forte subjuga o mais fraco; os animais comem uns aos outros; e cada animal favorece aos da sua própria espécie? Teria poder para justificar o especismo? Não, porque isso seria assumir a seguinte premissa: “se algo é natural, então é justificado”. O problema com essa premissa aparece logo que perguntamos o que se quer dizer com o termo “natural”. No sentido que é empregue nesse argumento, quer dizer que é algo que acontece sem intervenção deliberada humana, ou que segue os processos evolutivos inconscientes. Mas, então, por que isso seria relevante moralmente? No que apontar que algo simplesmente acontece sem intervenção humana ou planejamento racional seria relevante para nos dar razões para agir dessa ou daquela forma? Não parece contraditório buscar razões para agir justamente em processos que, desde Darwin, sabemos que não são processos racionais? É curioso que alguns cientistas, muitos dos quais aceitam a teoria da evolução, baseiem-se nessa premissa muito problemática. Uma coisa é “como as coisas são?”; outra é “como as coisas deveriam ser?”. Dizer que algo é da maneira que é não dá razão alguma para concluirmos que, então, esse algo é automaticamente bom ou correto.
A falha em todas essas tentativas de se justificar o especismo está em não se perceber que a principal razão para se respeitar seres humanos não se dá por estes serem humanos, nem por serem racionais, e nem porque na natureza cada animal privilegia os da sua espécie, e sim, simplesmente porque seres humanos são capazes de sofrer e desfrutar. Essa razão muito simples é o que melhor explica o dever de se respeitar alguém. Alguém precisa de respeito porque valoriza estar em um determinado estado e não em outro e é vulnerável. Para isso, é preciso ser senciente (capaz de sofrer e desfrutar). Todo ser senciente prefere desfrutar de experiências mentais positivas ao invés de negativas. Todos nós reconhecemos que sofrer e/ou ser privado de desfrutar de algo bom, é ser prejudicado. Ser capaz de sofrimento/desfrute é uma razão suficiente para se respeitar alguém, pois então esse alguém pode ser prejudicado ou beneficiado de acordo com o que decidirmos. Para haver possibilidade de alguém ser prejudicado, basta ser senciente, independentemente de espécie, de grau de racionalidade e do que acontece na natureza. A mesma razão que explica por que devemos respeitar humanos explica ao mesmo tempo porque devemos respeitar qualquer ser capaz de sentir, independentemente de espécie.
Outro resultado infeliz do debate é que por vezes centra-se a discussão em se saber se houve ou não maus tratos durante o experimento. O que isso parece indicar é que, então, ambos os lados do debate estão a aceitar a seguinte premissa: “se não houver maus tratos durante um experimento, então, ele é automaticamente justificado”. Essa premissa só faria sentido se sofrer fosse a única maneira de se prejudicar alguém. Mas, existe pelo menos outra maneira bem conhecida de se prejudicar alguém: assassiná-lo, quando ainda lhe resta algo de bom a ser desfrutado.
Alguém poderia objetar, dizendo que é isso que explica a diferença entre humanos e não humanos quanto ao erro em matar: os primeiros fazem planos para o futuro e entendem o que é a morte; os segundos não. Essa objeção tem dois erros. O primeiro erro, menor, é que existem humanos (bebês, idosos senis, portadores de determinadas doenças mentais, etc.) que também não entendem o que é a morte e também não fazem planos para o futuro. O segundo erro, maior, é confundir “ser prejudicado” com “saber que será prejudicado”. A morte, quando é um dano, é um dano não devido ao que ela faz estar presente, mas devido ao que ela priva. Ela priva alguém de desfrutar sensações boas no futuro. E isso é assim independentemente desse alguém saber o que é a morte, ter feito planos para o futuro, ou sofrer antes da morte. Assim sendo, todos os seres com possibilidade de desfrutarem algo de bom no futuro são danados ao morrer. Então, não é tão importante discutir se houveram ou não maus-tratos durante os experimentos, haja vista que existem fortes razões para se objetar aos experimentos mesmo quando não existem maus-tratos, já que os animais, de qualquer maneira, são mortos depois.
Por fim, um comentário sobre outro argumento muito freqüente nos debates. Os defensores da experimentação acusam os defensores dos animais de hipocrisia por se beneficiarem da exploração animal (usarem remédios, comer comida de origem animal, andar de ônibus, por exemplo). Disso, eles concluem que, então, a exploração animal está justificada. O problema é que essa conclusão não seguiria da premissa nem que a premissa fosse verdadeira. É verdade, a acusação de hipocrisia poderia ser verdadeira em alguns casos (por exemplo, parar de comer comida de origem animal é algo que se pode fazer facilmente). Contudo, outras coisas são muito mais difíceis de fazer, haja vista que absolutamente quase tudo em nossa sociedade é feito à base de exploração animal.
Mas, a questão não é essa. Mesmo que todas as acusações de hipocrisia fossem verdadeiras, será que segue daí que, então, a prática que o suposto “hipócrita” está a criticar tem boas razões a seu favor? Obviamente que não. Uma questão é “qual o caráter do interlocutor?”, outra é “qual a coisa certa a se fazer?”. Imagine, por exemplo, que o tratamento de água fosse feito a base de trabalho infantil. Ninguém pode deixar de tomar água. Será que segue daí que então não existem razões contra o trabalho infantil e que alguém deve ser proibido de objetá-lo? E, supondo que o trabalho infantil fosse utilizado em um produto não necessário, como café. Supondo que quem estivesse a protestar tomasse café e que a acusação de hipocrisia fizesse sentido. Segue daí que não existem boas razões para se abolir o trabalho infantil? Obviamente que não. O interlocutor, no nosso exemplo fictício, apesar de hipócrita, estaria a fazer a coisa certa ao criticar a exploração. Acusar os defensores dos animais de hipocrisia com vistas a concluir que a experimentação animal se justifica é nada mais do que um caso da famosa falácia ad hominem. Aliás, parece que o fato de quase tudo em nossa sociedade ser feito à base de exploração animal é mais uma razão para aboli-la, pois então mostra que sofrimento e morte estão sendo impostos a um número gigante de seres sencientes.
Essas questões deveriam ser o ponto central do debate. As razões acima são as razões mais básicas para se rejeitar o especismo, e, com ele todas as práticas exploratórias sobre os não humanos, incluindo a experimentação animal. É a partir daí que o debate deveria se desenvolver. E é por não se estar discutindo os argumentos principais e se estar a perder tempo com argumentos que já assumem de antemão que o especismo está justificado que nosso entendimento das questões éticas que envolvem animais não humanos está, infelizmente, em um nível dos mais rasos.



Luciano Carlos Cunha - lucianoshred@gmail.com
Mestre em Ética e Filosofia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), licenciado em Educação Artística com habilitação em música pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), colaborador da revista eletrônica Pensata Animal, colunista do site ANDA e autor do blog Desafiando o Especismo.



segunda-feira, 14 de outubro de 2013

NATURISMO NO TERRITÓRIO DAS EMOÇÕES





Após o II ENNN Encontro Norte Nordeste de Naturismo que durou quatro dias, tendo como lema “Espiritualidade, Solidariedade e Compromisso”; e em torno disso muitas atividades que considero importantes de serem mencionadas nesse texto.

Necessário esclarecer que “Espiritualidade” não tem nada a ver com religião, crenças, Deus, Santos ou Profetas. Espiritualidade é um caso de amor maior do indivíduo em relação ao cosmos. Você toca na folha estará ao mesmo tempo tocando nas estrelas, é a universalidade sem fragmentos, é sentir o pulsar da vida em todas as direções, não há norte nem sul, não há fronteiras. No dia em que a espiritualidade tocar o homem não poderão existir guerras, violência, afrontas, porque o outro será um espelho que reflete ele mesmo.
 
Diariamente tínhamos um momento para reflexão dos elementos da natureza, fogo, terra, água e ar. No primeiro dia, uma fogueira foi acesa e a Rayssa fez abertura do evento de forma brilhante, louvando o “fogo” que em nosso corpo representa o coração, símbolo da paixão, do amor e da energia que nos faz movimentar. Todos os participantes mentalizaram o que deveria colocar para o universo, seus pedidos, anseios, desejos e provavelmente orações. Mas tudo de forma silenciosa em respeito às crenças individuais, que é um dos preceitos do Naturismo.

No segundo dia “a terra” com representação artística do amigo Jorge Bandeira, que deitou o seu corpo na terra molhada pelas chuvas que não dava trégua, mas foi bom que tenha sido assim em reconhecimento da nossa adaptação à natureza, não ao contrário. Antes da sua exposição, Jorge pede que tenhamos em mente as crianças ali presentes e o amigo Miguel que luta contra o câncer e sempre esteve em defesa do Naturismo na praia de Massarandupió. Deita numa posição fetal e os participantes colocam um punhado de terra sobre o seu corpo, e nada mais foi dito. Percebem a significância? É o encontro da vida e da morte, é a vida se manifestando da terra, vivida por uma criança que hoje luta e o seu final, coberta de onde surgiu. É o encontro dos opostos, é a vida que morre ou surge? É seu início ou fim? É a igualdade de todos os seres que vivem, é o direito de viver com dignidade. Não contive tamanha emoção e meus olhos lacrimejaram.

No terceiro dia, “a água” foi o terceiro elemento, exaltada a sua importância para a manifestação da vida, circulante em todo nosso organismo, além de nascermos por meio desse elemento. Todos passaram por uma fonte de água e ali se banharam. À noite foi o lançamento do livro “Naturismo – Um Corpo Não Fragmentado” em que tive a oportunidade de realizar uma breve apresentação, sem muita delonga por ver o cansaço de muitos que já tinham ido à praia, passado o dia em reuniões. Percebi a inconveniência de realizar uma palestra com muitos detalhes. O ponto alto do evento mais uma vez partiu da encenação do Jorge Bandeira de um texto escrito por Plínio Marcos (1935-1999), mostrando o índio transformado num mendigo, sem vida em seu olhar, sem alma e esperança. Culpa de quem? Dos que os tiraram das suas terras, mas também dos que calaram por medo, dos que nada fizeram para impedir a ganância, dos nossos antepassados e de cada um de nós que ficamos sentados, acomodados vendo passivamente o extermínio do homem nu, tirado à força de seu habitat, da terra e do seu lar. Culpa de quem? Mais uma vez pergunto. Por incrível que pareça encontro um dedo apontado em minha própria direção. Isso é consciência, Naturismo e Natureza andam de mãos dadas e antes de tudo, é um compromisso com a vida. (Edson Medeiros).
    
No quarto dia, encerramento com reverência ao “Ar”. A respiração, o reconhecimento que o corpo tem a sua própria sabedoria, o ar inspirado tem que ser solto, ninguém poderá reter como se um objeto fosse porque se for retido cessa a vida, tem que ser equilibrado, nem mais nem menos. Lembra-nos que a vida é uma fluidez e não estática, um constante dar e receber, que não somos donos de coisa alguma, só estamos usufruindo. Naturalmente surge a “gratidão”, que não é uma atitude e sim um sentimento. Não é que se tenha que agradecer a alguém, é andar no peito com a gratidão por todas as coisas e por todos que encontramos nessa passagem pela vida afora.
Algumas pessoas chegaram quando estávamos finalizando essa atividade ainda perguntaram: “Perdi alguma coisa?”
Sim, perdeu tudo, quem não participou perdeu muito.

Obrigado, as lições foram muitas. Aprendi que o Naturismo é também território das emoções.



Evandro Telles
14/10/13

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

NATURISMO - UM COMPROMISSO COM A VIDA

 



O título desse texto foi um destaque no artigo “Naturismo e Novas Vivências” do amigo Edson Medeiros e hoje, 04/10/13, é comemorado o “Dia Mundial dos Animais”. Neste dia, a vida animal em todas as suas formas é celebrada, e eventos especiais são planejados em locais por todo o mundo. Instituído em 1931 pelo Congresso Internacional de Partidários do Movimento em Defesa  da Natureza, data escolhida em homenagem a São Francisco de Assis considerado protetor dos animais.

Questiono: o que tem sido comemorado? Durante os últimos 500 anos extinguiram-se por completo 844 espécies animais e de acordo com as estimativas da Aliança Internacional de Proteção de Animais, cerca de um quarto de todos os mamíferos estão à beira da extinção.

O Naturismo, enquanto uma filosofia de vida que busca a integração do homem de forma harmônica com a natureza, universalista, pacífica, mostra como é lento o processo de conscientização. De um lado, uma sociedade que mercantilizou o corpo que deixa as pessoas obsessivas ou frustradas, de outro, não são muitos os praticantes que desejam o compromisso de ficar esclarecendo àqueles que nem se interessam em conhecer o tipo de transformação que esse movimento é capaz de realizar na vida do indivíduo. O resultado tem sido desalentador, principalmente para quem escreve, sente-se isolado, uma voz na multidão.

Às vésperas do II Encontro Norte Nordeste de Naturismo tendo como pilares temáticos a “Espiritualidade, Solidariedade e Compromisso”, mostra que o Naturismo tem evoluído para algo mais do que a simples nudez corporal. A abordagem desses assuntos é significativa e ao mesmo tempo provocativa. Significativa porque a Espiritualidade implica ir além das crenças religiosas, a bem da verdade nada tem a ver com religião e sim como podemos SENTIR A VIDA, não é racional e sim existencial.

O homem quando se despe predispõe-se a mudanças mais fundamentais e significativas em sua vida. Tendo recuperado este espaço de liberdade que é o seu próprio corpo, tendo superado este imenso tabu que é a nudez, um horizonte todo se alarga, propiciando reflexões mais amplas e aprofundadas sobre o existir, sobre o viver. Antigos valores, arcaicas crenças, códigos, posturas, comportamentos condicionados pela velha moral, começam a ser repensados, redefinidos, questionados”. (Edson Medeiros)
 
O Naturismo assim torna-se uma técnica para que possamos ver a vida de uma forma diferente e mais humana. Os prazeres obtidos nos encontros não se tornam objetivos e sim conseqüências da conquista da liberdade e de se sentir uno com toda a natureza. Somente pelo título do livro “Todos os Animais São Nossos Irmãos” de Marcel Benedeti já nos sensibiliza que temos que repensar sobre o direito à vida.

O Congresso Espanhol aprovou o texto do Projeto de Lei que declara a tourada como patrimônio cultural. Mais uma vez perde os protetores dos animais e o Naturismo também enfraquecido pela desvalorização da vida que tanto defendemos. Até quando o ser humano suportará a sua agressividade e violência?




Evandro Telles
04/10/13


quinta-feira, 3 de outubro de 2013

A BELEZA OCULTA NO NATURISMO



“EIS O MEU SEGREDO. É MUITO SIMPLES: SÓ SE VÊ BEM COM O CORAÇÃO. O ESSENCIAL É INVISÍVEL AOS OLHOS”
 (Antoine de Saint-Exupéry em O Pequeno Príncipe)


A famosa frase de Vinícius de Moraes “As feias que me desculpem, mas beleza é fundamental”, que até hoje causa controvérsias e críticas, pode ter lá suas razões bem fundamentadas, desde que possamos definir e esclarecer o que é beleza.

No campo da filosofia não há um consenso sobre a questão do que é beleza, os filósofos nunca concordam entre si a respeito de um possível conceito do belo. E mesmo entre os que acha ser possível concebê-lo, o modo de elaboração conceitual é muito divergente. (Evando Nascimento, formado em Letras e Filosofia, pós-doutorado na Universidade Livre de Berlim).

As indústrias da moda e cosmética aproveitaram o gancho do nosso famoso poeta para fazerem suas propagandas que dizem a verdade, mas nem toda a verdade. É passado para o público algo incontestável, no entanto, mais uma vez o sistema faz das pessoas umas marionetes que podem ser manipuladas. O resultado disso se chama “frustração”. Por quê? A frustração é a sombra da expectativa. Quanto mais se cria expectativa de algo não realizado, maior é a frustração do indivíduo. É o mesmo que viver no futuro, ele nunca chega, é uma ilusão.

Se não bastasse essa indefinição, existe ainda o sentido muito pessoal. A arte que vejo como bela pode não ser para o outro. Só isso já seria o suficiente para percebermos que vivemos num mundo totalmente ilusório e a própria ciência atesta isso. A nossa sociedade criou a ilusão do corpo perfeito e as pessoas se sentem ofendidas quando são colocadas como velhas. Alguns países orientais a velhice é sinônimo de sabedoria e belo, se as julgarem novas é que será uma ofensa.

Fica muito nítido que quando os valores são trocados distorções acontecem. O Laércio Júlio da Silva em seu artigo “A Beleza que Ameaça a Juventude”, publicado no Jornal “Diário da Manhã” em 01/08/2009 já chamava atenção sobre esse assunto dizendo: “O fato é que não podemos deixar crescer uma geração apegada a valores fúteis vitimada por uma paranóia que não é inerente à da vontade de viver do jovem”.

 A natureza adora se ocultar, esse é o jogo. A natureza é como as raízes das árvores, ela fica na profundidade do solo – o mais essencial está oculto. Nunca considere que a árvore é o mais essencial. Ela é apenas a periferia de onde vêm as flores, folhas e frutos. A árvore verdadeira existe no subsolo, no escuro, se cortar as raízes tudo desaparece. Caminhe em direção ao ser, ao centro, à própria base. Procure sempre as raízes, e não se deixe enganar pelas folhagens – Se uma pessoa é bonita na superfície, você se apaixona; você se apaixonou pela folhagem. Mas a pessoa pode não ser bonita por dentro, ela pode ser absolutamente feia – e você caiu na armadilha (Osho – A Harmonia oculta).

Algumas pessoas entendem que o Naturismo é tirar as roupas, não é nada disso, nem mesmo uma negação da sexualidade. É, na verdade, um modo sutil de expor o que está oculto, de expor a Divindade existente em cada um de nós. “Deus está se ocultando na flor. Se você simplesmente perceber a flor, errará o alvo”.

A beleza do Naturismo está oculta, a natureza não é exibicionista. Isso deve ser bem compreendido para que possamos desenvolver a percepção e assim encontrar o real sentido de que a beleza é realmente fundamental porque é algo que parte do nosso íntimo. Só podemos ver o mundo bonito quando nosso interior consegue ver a beleza de toda a existência, que não fala e diz tudo, não julga nem condena, simplesmente mostra, e é assim que vivemos o sentido do Naturismo, só pode ser visto com o coração.



 Evandro Telles
05/09/11

“A MANEIRA QUE ESCOLHEMOS VER O MUNDO CRIA O MUNDO QUE NÓS VEMOS.”  (BARRY NEIL KAUFMAN).